(sinais de que sua vida sempre foi um grande estudo de caso — e você nem percebeu)

21.03.2025
Antes de decidir mergulhar nas águas profundas da psicologia analítica junguiana e da arteterapia, eu ainda nadava na superfície das minhas próprias dúvidas. E foi ali, boiando entre incertezas e perguntas mal formuladas, que encontrei um salva-vidas em forma de livro: Cartas a um Jovem Terapeuta, de Contardo Calligaris.
Com a elegância de quem já viu muito — e julgou pouco —, Calligaris desenha com delicadeza (e uma pitada de cinismo honesto) os contornos da alma de um psicoterapeuta. E, veja só, não tem nada a ver com ser “bonzinho”, “iluminado” ou “transformador nato”. Ao contrário: segundo ele, o bom terapeuta é aquele que, entre outras coisas, já enfrentou a própria bagunça interna, tem uma queda pela complexidade humana e não faz questão de virar santo em vida.
Os pré-requisitos? Prepare-se:
- Gosto pela palavra (sim, até pelas não ditas).
- Carinho genuíno por gente — mesmo as que não usam filtro, nem social, nem de Instagram.
- Curiosidade pela vida dos outros, sem a menor pressa de rotular.
- Um tiquinho (ou um tantão) de sofrimento psíquico — porque ninguém confia em quem nunca desmoronou.
- Desejos esquisitos — daqueles que você não comenta no jantar em família.
- Capacidade de olhar para tudo isso com o mínimo de julgamento e o máximo de ternura.
- E, talvez o mais libertador: não nutrir o projeto megalomaníaco de ser notável, respeitado e ovacionado pelo resto da existência.
Foi nesse momento que fechei o livro, olhei para mim mesma — e dei risada.
Porque, honestamente? Se fosse um checklist, eu já estava quase psicoterapeuta por direito adquirido.
Chegar aos cinquenta com a bagagem cheia de histórias (umas lindas, outras vergonhosas e algumas que não posso contar aqui) não é só um privilégio, é matéria-prima. Sofri, julguei, me decepcionei, caí em armadilhas emocionais dignas de novela das nove… mas também amei, acolhi, me refiz, me reinventei e aprendi que o mundo não gira em torno das minhas certezas. Ainda bem.
A verdade é que eu não me tornei terapeuta apesar da vida — me tornei terapeuta por causa dela.
Então, se você também já se sentiu um pouco “fora da curva”, já chorou por nada e depois riu por tudo, já sonhou acordada e se desconcertou com o próprio desejo… bem-vinda.
Talvez você também tenha nascido com a alma de uma terapeuta — só faltava um empurrãozinho (ou um livro) pra perceber.
Aqui, a arte da terapia começa na própria vida. E continua, de salto, de pantufa ou do jeito que der.