
03.05.2025
Dizem que autocuidado é passar argila na cara e desligar o celular. Discordo. Autocuidado, minha amiga, é conseguir ir ao banheiro sem alguém te chamar pela porta. É lembrar que você também tem umbigo — e que ele merece um pouco de atenção depois de tanto girar em torno dos outros.
Nos venderam a ideia de que cuidar de si é luxo. Uma indulgência. Um mimo esporádico para quando der tempo — como se tempo sobrasse. Mas o que ninguém conta é que, para chegar ao tal momento de autocuidado, você precisa antes atravessar um campo minado de boletos, reuniões, caronas para o inglês e uma sensação crônica de que está sempre devendo alguma coisa a alguém (inclusive a você mesma).
E então, a gente se esquece. De respirar. De se nutrir. De existir como mulher, e não apenas como função. Quantas vivem assim? Muitas. Quantas percebem isso antes de esgotar todas as reservas — físicas, mentais e emocionais? Pouquíssimas.
Arthur C. Brooks disse uma verdade daquelas que a gente só entende tarde demais:
“O autocuidado é como uma conta para a aposentadoria: quanto mais cedo você investir, maiores serão os retornos.”
Mas, cá entre nós: a gente tem o hábito incômodo de deixar para cuidar de si quando o corpo já grita, o humor já implora, e a alma está no cantinho, emburrada.
E é aí que eu te faço um pedido, desses que deveriam vir junto no manual de sobrevivência da mulher moderna: coloque a máscara de oxigênio em você primeiro. Não por egoísmo, mas por estratégia. Só quem respira bem consegue salvar os outros sem desmaiar no processo.
Porque autocuidado é mais do que skincare e planner colorido. É um conjunto de ações intencionais para promover o bem-estar físico, mental e emocional da mulher. É sobre priorizar suas necessidades e desejos — inclusive os mais bobos, como querer silêncio. Ou os mais ambiciosos, como ter tempo para si sem pedir desculpas por isso.
Inclui saúde, sim. Higiene, alimentação, corpo em movimento. Mas também inclui rir com uma amiga, tomar café sozinha, desligar o celular por escolha (não por falta de bateria), e até sumir de certas conversas onde você só serve para escutar, nunca para ser escutada.
E por que, afinal, esse movimento simples de se cuidar provoca tanta culpa? Por que sentimos que estamos fazendo algo errado ao escolher cinco minutos de paz?
Simples. Porque crescemos ouvindo que mulher boa é mulher disponível. Que o tempo dela deve ser dos filhos, do marido, do trabalho, da família. E, se sobra um minuto, aí sim, ela pode fazer as unhas — rápido, antes que alguém precise dela de novo.
A culpa se instala porque:
- Fomos treinadas para sermos indispensáveis.
- Existe uma crença subterrânea de que autocuidado é egoísmo.
- Queremos ser perfeitas (como se isso não fosse a receita perfeita para a exaustão).
- Não sabemos dizer “não” sem ensaiar vinte justificativas.
- Falta apoio. Falta espaço. Falta reconhecimento.
- E, não raro, sobra autocobrança — dessas que a gente disfarça com eficiência e um leve tremor no olho esquerdo.
Mas olha, aqui entre nós: cuidar de si não é negligenciar os outros. É justamente garantir que você possa continuar cuidando, sem se despedaçar no processo.
Na arteterapia, aprendi que a culpa só perde a força quando a gente a olha de frente e pergunta: “Você é minha ou foi colocada aqui por alguém?” E que a mulher que se cuida inspira outras a fazer o mesmo. Não por ego, mas por lembrança: de que também temos direito ao básico. Ao essencial. Ao bem-viver.
Então, da próxima vez que pensar que não dá tempo para você, lembre-se: o mundo não vai acabar se você sair da função por meia hora. Mas você pode acabar — silenciosamente — se nunca sair.
E, se for para tropeçar, que seja a caminho de si. De salto ou de pantufa. Tanto faz.